"A poesia não pertence ao poeta, mas aos que precisam dela".
Mário faz a leitura de um poema de Neruda, que trata da angústia do homem frente à vida comum:
“Vou ao cinema, passo no alfaiate, mas acontece
que me sinto enrugado e entorpecido
como um cisne grande e confuso
na superfície de um oceano de fracassos e causas.
O cheiro da barbearia me desperta e grito:
Assassinato! Estou cansado de ser apenas um homem”.
Na porta da casa de Neruda, este explica o que é metáfora, através de uma comparação, quando pergunta a Mário como ele entenderia uma frase onde se dissesse que o céu estava chorando. Mário que é um poeta nato afirma imediatamente que se trata de uma imagem para chuva. Note-se, e guarde-se para uso futuro, que o poeta está interessado em ensinar a seu discípulo a feitura de metáforas. Conceito para o qual sua atenção espontaneamente se volta e que ele exerce magistralmente, sem nenhuma dúvida.
Na segunda cena, a mais importante, e que se passa à beira-mar, Neruda declama e pergunta a opinião de Mário sobre esse poema:
“Aqui na ilha há tanto mar,
O mar e mais o mar.
Ele transborda de tempo em tempo.
Diz que sim, depois que não,
Diz sim e de novo não.
No azul, na espuma, em galope
Ele diz não e novamente sim.
Não fica tranqüilo, não consegue parar.
Meu nome é mar ele repete
Batendo numa pedra, mas sem convencê-la.
Depois com as sete línguas verdes
De sete tigres verdes, de sete cães verdes,
De sete mares verdes
Ele a acaricia, a beija e a umedece;
E escorre em seu peito
Repetindo seu próprio nome.”
Mário diz que está enjoado e Neruda considera esse julgamento muito severo. Mário explica, então, que seu enjôo não foi causado pela qualidade do poema, mas antes porque se sentiu, enquanto o ouvia, jogado de um lado para o outro, como um barco, sacudido pelas palavras. Neruda, bom professor, não perde a oportunidade e mostra que ele fez uma metáfora. No entanto, Mário retruca:
- "Mas, fazer metáfora assim, não vale. Foi sem querer".
Neruda: - "Querer não é importante. As imagens devem surgir espontaneamente". Mário: - "Você quer dizer que o mundo todo, o mar, o céu com a chuva, as nuvens... o mundo todo é, todo ele, metáfora de alguma outra coisa
“Vou ao cinema, passo no alfaiate, mas acontece
que me sinto enrugado e entorpecido
como um cisne grande e confuso
na superfície de um oceano de fracassos e causas.
O cheiro da barbearia me desperta e grito:
Assassinato! Estou cansado de ser apenas um homem”.
Na porta da casa de Neruda, este explica o que é metáfora, através de uma comparação, quando pergunta a Mário como ele entenderia uma frase onde se dissesse que o céu estava chorando. Mário que é um poeta nato afirma imediatamente que se trata de uma imagem para chuva. Note-se, e guarde-se para uso futuro, que o poeta está interessado em ensinar a seu discípulo a feitura de metáforas. Conceito para o qual sua atenção espontaneamente se volta e que ele exerce magistralmente, sem nenhuma dúvida.
Na segunda cena, a mais importante, e que se passa à beira-mar, Neruda declama e pergunta a opinião de Mário sobre esse poema:
“Aqui na ilha há tanto mar,
O mar e mais o mar.
Ele transborda de tempo em tempo.
Diz que sim, depois que não,
Diz sim e de novo não.
No azul, na espuma, em galope
Ele diz não e novamente sim.
Não fica tranqüilo, não consegue parar.
Meu nome é mar ele repete
Batendo numa pedra, mas sem convencê-la.
Depois com as sete línguas verdes
De sete tigres verdes, de sete cães verdes,
De sete mares verdes
Ele a acaricia, a beija e a umedece;
E escorre em seu peito
Repetindo seu próprio nome.”
Mário diz que está enjoado e Neruda considera esse julgamento muito severo. Mário explica, então, que seu enjôo não foi causado pela qualidade do poema, mas antes porque se sentiu, enquanto o ouvia, jogado de um lado para o outro, como um barco, sacudido pelas palavras. Neruda, bom professor, não perde a oportunidade e mostra que ele fez uma metáfora. No entanto, Mário retruca:
- "Mas, fazer metáfora assim, não vale. Foi sem querer".
Neruda: - "Querer não é importante. As imagens devem surgir espontaneamente". Mário: - "Você quer dizer que o mundo todo, o mar, o céu com a chuva, as nuvens... o mundo todo é, todo ele, metáfora de alguma outra coisa
Mário faz poemas nas coisas, lidando diretamente com elas, como quando relaciona a bola do jogo de futebol de mesa com a Lua, e faz seu primeiro poema, um círculo desenhado. Cena belíssima e muito importante, pois descreve o conceito de símbolo através da bola que interliga, a Lua, a mulher celeste e arquétipo do feminino, com a curva da boca de Beatriz Russo, a mulher terrestre. Desse modo, Mário faz poemas o tempo todo; espontâneos, compostos dos gestos simples do quotidiano, experimentados diretamente nas coisas e transfigurados por uma alma predisposta à compreensão simbólica.
Isto não quer dizer que Neruda, o poeta das coisas, desconheça esse tipo de poesia, pois ele mesmo afirma para Mário:
"... quando explicamos a poesia ela se torna banal. Melhor do que qualquer explicação é a experiência direta das emoções, que a poesia revela a uma alma predisposta para compreendê-la".
E acrescenta:
"Ser poeta é ser capaz de olhar as coisas. Vá caminhando pela praia observando tudo".
Isto não quer dizer que Neruda, o poeta das coisas, desconheça esse tipo de poesia, pois ele mesmo afirma para Mário:
"... quando explicamos a poesia ela se torna banal. Melhor do que qualquer explicação é a experiência direta das emoções, que a poesia revela a uma alma predisposta para compreendê-la".
E acrescenta:
"Ser poeta é ser capaz de olhar as coisas. Vá caminhando pela praia observando tudo".
Como Mário é um poeta, nas coisas, ele vive seu poema nas coisas mesmas. Ele não o capta das coisas através da mediação da escrita, mas o capta diretamente nas ondas, no som dos sinos, nos ventos, na batida do coração do filho e mesmo no céu estrelado, como se estivesse refazendo a criação. Esse é o poema mais radical e vital que pode existir.
O grande, único e sintético poema nas coisas que Mário pariu como um filho, dentro de um carrinho de bebê, com a mesma força que gerou sua vida singular, é este:
Número um:
ondas em Cali Sotto. Pequenas.
Número dois:
ondas grandes.
Número três:
vento nos rochedos.
Número quatro...
vento nos arbustos.
Número cinco...
redes tristes do meu pai.
Número seis...
o sino da igreja. Com padre.
(Belo. Não havia notado antes
como era tudo tão belo).
Número sete...
céu estrelado na ilha.
Número oito...
o coração de Pablito.
O grande, único e sintético poema nas coisas que Mário pariu como um filho, dentro de um carrinho de bebê, com a mesma força que gerou sua vida singular, é este:
Número um:
ondas em Cali Sotto. Pequenas.
Número dois:
ondas grandes.
Número três:
vento nos rochedos.
Número quatro...
vento nos arbustos.
Número cinco...
redes tristes do meu pai.
Número seis...
o sino da igreja. Com padre.
(Belo. Não havia notado antes
como era tudo tão belo).
Número sete...
céu estrelado na ilha.
Número oito...
o coração de Pablito.
A imagem é a última do filme onde Neruda relembra sua relação com Mário, emocionado e mínimo em frente à imensidão do mar, sob a altura majestosa do rochedo, completamente absorvido pela poesia nas coisas.
O texto, (transcrito abaixo em tradução provisória), é o poema feito por Neruda em homenagem ao amigo, que aparece depois dos créditos do filme, no qual ele reconhece honestamente que só naquela instante encontrou a Poesia.
“E foi naquela Época...
A poesia chegou me procurando.
Eu não sei, não sei de onde ela veio,
se de um inverno ou de um rio.
Eu não sei como nem quando.
Não, não eram vozes,
não eram palavras, nem silêncio;
mas de uma rua eu fui chamado abruptamente
dos ramos da noite, dos outros,
no meio de um tiroteio violento,
e num retorno solitário lá estava eu
sem um rosto... e ela me tocou”.
Pablo Neruda
O texto, (transcrito abaixo em tradução provisória), é o poema feito por Neruda em homenagem ao amigo, que aparece depois dos créditos do filme, no qual ele reconhece honestamente que só naquela instante encontrou a Poesia.
“E foi naquela Época...
A poesia chegou me procurando.
Eu não sei, não sei de onde ela veio,
se de um inverno ou de um rio.
Eu não sei como nem quando.
Não, não eram vozes,
não eram palavras, nem silêncio;
mas de uma rua eu fui chamado abruptamente
dos ramos da noite, dos outros,
no meio de um tiroteio violento,
e num retorno solitário lá estava eu
sem um rosto... e ela me tocou”.
Pablo Neruda
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